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Ainda vale a pena ser honesto nos dias atuais?

Com tantos escândalos de desvio de dinheiro público e outras irregularidades divulgadas pela mídia, muitas pessoas chegam a duvidar se agir sempre corretamente é a melhor postura a tomar.

Dois episódios narrados pelo Prof. Kentetsu Takamori, autor do livro “Porque vivemos”, ajuda-nos a refletir sobre essa questão muito importante para a formação humana.

Um samurai estava a viajar. Como seu criado ficara para trás, ele fez uma pausa e esperou. Por fim, o criado veio correndo, sem fôlego.

“O que estava fazendo?”, perguntou o samurai.

“Minha sandália de palha arrebentou e eu estava a consertar”.

“Quem lhe deu a palha?”

“Ninguém. Peguei de uns pés de arroz que estavam a secar  na beira da estrada.”

“Pediu permissão?”

“Não”, disse o criado. “Ninguém vai se importar para dois ou três caules de palha de arroz. E toda a gente faz isso o tempo todo”.

“Não admito essa atitude. Toda a gente pode permitir isso, mas eu não. Volte e peça permissão ao proprietário”, disse o samurai.

O samurai sabia que essas duas desculpas – “toda a gente faz” e “é tão pouco que não faz diferença” – estão sempre na boca do demónio.

Kentetsu Takamori

O senhor feudal japonês Tokugawa Mitsukuni (1628-1701) estava numa viagem de inspeção em seus domínios. Um aldeão, famoso por maltratar a mãe, ao saber que o senhor daquelas terras recompensaria qualquer pessoa que demonstrasse respeito aos pais, e desejando receber o prêmio, carregou sua mãe nas costas e juntou-se à multidão que saudava o ilustre visitante.

Mitsukuni viu aquele homem carregando a própria mãe e mandou um auxiliar dar-lhe uma recompensa.

“O senhor não devia fazer isso”, disse o auxiliar. “Esse sujeito é famoso por maltratar a mãe o tempo todo. Ele só está aqui hoje com a mãe nas costas para tentar enganar o senhor e receber alguma coisa.”

Mitsukuni ouviu, pensativo, e disse:

 “Que diferença faz isso? Mesmo que ele tenha tomado essa atitude com segundas intenções, e mesmo que seja apenas hoje, o importante é que, ao menos desta vez, ele demonstrou o devido respeito. Dê ao homem uma boa recompensa”.

Quem toca em tinta vermelha fica manchado de vermelho.

Quem se associa com gente boa sentirá um desejo natural de fazer o bem. Faça o bem, mesmo que seja só por imitação.

Kentetsu Takamori

Diante de determinadas situações, podemos pensar: não seria melhor “dançar conforme a música” e deixar de ser o “certinho e bonzinho” e ser mais “flexível e esperto”? Afinal de contas, “toda a gente faz” e, “é tão pouco que não faz diferença”.

Pensamentos e argumentos desse tipo estão muito mais presentes em nosso cotidiano do que imaginamos. E não se relacionam apenas ao dinheiro ou bens materiais.

Ao estacionar o carro num local proibido por falta de tempo ou utilizar o comboio sem validar adequadamente o título de transporte, mesmo sabendo que isso não está correto, fazemos com base nessas justificativas.

Mas será que realmente “é tão pouco que não faz diferença”? E, se “toda a gente faz”, mesmo algo incorreto passará a ser correto ou, no mínimo, aceitável?

São indagações que precisamos fazer a nós mesmos, antes de apontar o dedo aos condenados da Operação Marquês.

Há um provérbio japonês que diz: “Ao ver apenas uma parte, podemos deduzir o  todo”. Isso significa que ao ver uma ação ou atitude, podemos inferir como é a postura e o caráter de uma pessoa. Ou ainda, que a nossa personalidade está sendo constantemente construída a cada ação que praticamos, por menor que ela seja.

Não podemos menosprezar a força que cada ação praticada exerce sobre a nossa vida cotidiana, pois como até a Ciência já comprovou, para toda ação sempre existirá uma consequência. Isso não aplica-se apenas à Física, mas a todas as esferas da nossa vida, tanto no âmbito profissional quanto pessoal, familiar e social.

Todos nós cometemos erros; e não poderia ser diferente. Afinal, somos humanos.

Mas precisamos ter a sabedoria e humildade de sempre nos esforçar ao máximo para plantar boas sementes, pois só assim colheremos bons frutos. Mesmo que seja só na aparência, pois isso já será o primeiro passo para uma mudança feliz.

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Professor de filosofia budista, autor, diretor de conteúdo e presidente da ITIMAN. Diretor internacional da Ichimannendo Publishing Co. Ltd. - Tóquio, Japão.

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